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“Tu casa es mi casa”, série onde o cantor e compositor Paulinho Moska, viaja para doze cidades da América Latina e, em cada encontro com pessoas – da música, da ciência e da arte – um tema é visitado.
No episódio 4 no Rio de Janeiro, o tema é: AUTOCONCIÊNCIA. Em parceria com Zélia Duncan, Moska compõe em dois dias a música Eunigma, o enigma do eu. Antonio Bokel, um artista que explorou muitas mídias visuais, cria uma tatuagem temática, que Paulinho tatua no braço. E, Daniel Mograbi, cientista aborda a capacidade que temos de autoconhecimento, a autoconsciência. Estes são os olhares que quero aqui compartilhar.
Começo com algumas reflexões de Mograbi, que fala do cérebro como o palco onde a mente se desenrola. Um dos momentos onde o saber tem verdadeiro sabor!
Dentro da mente a consciência ocupa um espaço pequeno. Porque na verdade, a maior parte do nosso processamento mental, é inconsciente. Dentro desse pedaço pequeno, tem um pedaço menor ainda que é a autoconsciência. Essa autoconsciência, a gente tende a pensar que é o mais próximo, e o mais próximo que a gente vai conhecer melhor. Mas aí, eu acho que tem um erro de perspectiva mesmo, ele é tão próximo que a gente não consegue ver direito.
Existe uma vinculação muito forte entre autoconsciência e depressão.
Ainda não sabemos a direção de causalidade aí. Por um lado pode ser, que ter muito autoconsciência faz com que você fique mais deprimido, porque afinal você sabe melhor quem você é, e aí você vê o que você é, e você não gosta do que você vê, e fica um pouco mais deprimido. Por outro lado, pode acontecer o que a gente chama de realismo depressivo, que é: no que você fica mais deprimido, você perde todos esses viésses positivos, e vê mais a realidade como ela é. Você fica mais autoconsciente porque ficou mais deprimido.
É muito importante estar com os olhos abertos, mesmo que, o quê a gente esteja vendo, não seja o mais bonito.
A partir de estudos com pessoas que apresentam anosognosia (perda de consciência e negação sobre a própria doença e suas limitações), Mograbi aponta uma característica fascinante do cérebro e da mente: criar narrativas coerentes pro mundo. Por isso o outro tem uma importância tão grande. Quando você se vê numa outra perspectiva, você ganha autoconsciência.
Sobretudo através da Arte, você consegue acessar conteúdos que dificilmente você conseguiria acessar sozinho. Assistimos um filme, ou ouvimos uma música, para poder sentir aquele sofrimento que a gente, pessoalmente está tendo dificuldade de sentir. A Arte te comunica coisas que estão muito perto de você. E aí de novo, essa coisa da perspectiva: tá tão perto, que você precisa que venha de fora, pra que você consiga reconhecer.
Bokel a partir das reflexões de Mograbi começa sua criação com frases poéticas: A mente mente / Somente ausente / E o coração sente. A minha Arte ela não é muito conceitual. Eu tento sempre, abrir o leque de opções de interpretações. Porque eu mesmo, não faço a coisa muito intelectual.
É um processo de deixar acontecer. O que mais me toca quando estou trabalhando é quando acontece esses acidentes, esses acasos que me fazem entender por alguns segundos, que a gente não tem controle de nada. Eu acho que a Arte, me ensina isso. E se eu passo isso de alguma forma, já seria pra mim algo importante assim. Eu acho que é importante a gente jogar luz pros nossos demônios. Jogando luz você conhece eles. Nunca vão deixar de existir, mas vai Ser seu amigo. A gente não quer olhar pros nossos demônios, porque no fundo, é a gente com a gente mesmo, aqui. Culpamos sistemas, políticas, coisas externas, para realmente não mergulhar neles.
A Arte também possibilita isso. Você ir lá, visitar um pouco aquilo e trazer à tona. É você jogar luz para aquilo.
O momento no Brasil agora, é um momento complicado economicamente, a gente está passando por uma crise. Eu posso falar que é um momento desfavorável economicamente, momento desfavorável politicamente para a Arte. Mas é um momento muito favorável pra criação, eu acho que esses momentos são preciosos!
É um momento de fazer Arte!
A graça são os erros. É ali que a magia acontece. É ali que você está conectando. Isso aqui possibilita você errar, você ser errado. Isso é muito bom, é muito libertador.
A falha humana, é a beleza.
Moska e Duncan, terminam o episódio com a apresentação de Eunigma, uma belíssima MPP – Música Pra Pensar:
Estranho minha própria língua
Eu só queria saber de você
Tudo o que eu não sei de mim
Quanto mais procuro menos sei
Dos lugares da minha razão
Minha mente sente a dor do choque
Pensamento é ilusão eu sei
Toda memória é reconstrução
E sempre cabe um novo retoque
Aumente a mente sem saber
Não saiba nada
E assim caiba dentro de você
Realizada
Se vai tentar se conhecer (refrão)
Não se esqueça
O labirinto que se vê
É a luz da sua cabeça
Escolho todo tempo
Quem eu sou
Jogo no lixo tudo que sobrou
Apago crimes
Ninguém me delata
Mas o melhor preparo pra depois
O que sublinha é só para nós dois
E a consciência ficou abstrata
Refrão
Sou tão próxima de mim que até
Me perco, fico sem saber quem é
Que tá no espelho
E o olho me retrata
O que eu faço não é certo não
Porque o certo não cabe na mão
Eu levo a vida como um acrobata
Refrão